Blog para contos de ficção científica, literatura fantástica e terror
Trabalhava já há dias para restaurar uma antiga câmara de pedra recém descoberta na Grécia. Uma revolução histórica, mantida em segredo até o que esperava que fosse o anúncio oficial. Por se tratar de um achado em uma localidade quase desabitada, poucos sabiam de sua existência. Um jovem mestre entre os restauradores fora chamado após assinar um contrato sigiloso. O dinheiro não faria tanta diferença, mas a glória de saber que trouxera à vida algo que estava encoberto anos e anos pela poeira e degradação ambiental, o fazia satisfeito. Sua equipe revezava-se em turnos para dar conta daquele achado, mas nas últimas semanas o mestre preferira trabalhar sozinho. O supervisor vinha a cada três dias e a sua única companhia era Andros, um rapazinho que trazia-lhe o almoço e, desde que ele recentemente se mudara para a câmara, o jantar.
Certa tarde, quando Andros acabara de sair levando a louça suja e deixando a refeição noturna, percebeu uma silhueta feminina se aproximando. Seria uma das moças do vilarejo? Pouco provável, devido à distância. Empertigou-se, mas observou silenciosamente. A jovem de olhos baixos, submissos, tinha os cabelos envoltos em um comprido véu que descia até a sua cintura. A túnica lembrava o exotismo oriental cobrindo todo o corpo, mas denotando uma transparência que parecia lhe convidar. O pescoço perfeito, a clavícula reta e bem desenhada, os seios arredondados, as curvas que ondulavam seu ventre, os quadris largos, as pernas torneadas… Parecia um sonho de adolescente. A garganta secou no mesmo momento em que ela apareceu, como se aquela fosse a única fonte de hidratação e saciedade que lhe restara no mundo. E ele precisava tê-la, da maneira que fosse, custasse o que custasse. Somente mais tarde ele entenderia que custaria muito caro…
Esqueceu-se do trabalho que executava e do prazo de entrega da obra, descendo apressado dos andaimes. Algumas ferramentas caíram na pressa provocando um forte estalido na câmara vazia. Tudo ecoou. Ecoou em sua mente o ruído das ferramentas, o farfalhar das roupas da jovem e algo mais que ele não conseguia reconhecer, mas que parecia estar com ela. Andou em sua direção e ela manteve os olhos no chão, como que envergonhada por estar ali. Quanta doçura naquele rosto delicado! Quanto mais se aproximava, maior era a sua sede. A mente dava mil voltas… Os dois sozinhos naquele ermo… Uma jovem indefesa diante de seus desejos mais primários, um local histórico e que serviria de alcova para os dois amantes. Lá fora a noite e nada mais. Ninguém mais.
Estava a três passos de distância dela quando resolveu estender-lhe a mão. O instinto o faria atirar-se por cima dela, subjugando-a, entretanto, não conseguia deixar de ser gentil com aquela criatura de expressão quase infantil. Tomou-lhe o rosto com a mão forçando-a a olhar para ele. Mas ela não o fez. Timidez, pensou. Não era bem isso que pareceu em seguida, pois a moça fechou os olhos e umedeceu os lábios, certamente esperando um beijo. Como gentil cavalheiro ele não a decepcionou e os lábios se moveram hesitantes no início, para logo tornarem-se urgentes. Matou a sede em sua saliva doce enquanto as mãos percorriam a extensão daquele corpo firme e macio. Era uma confusão de sentidos e ele não quis esperar, rasgando a delicada túnica que recobria a jovem e suas próprias roupas já bem surradas pelo trabalho. Sem abrir os olhos, deitou-se por cima dela e explorou-a com a língua, com os dedos, ouvindo-a gemer a cada toque. Quando ela enrolou suas pernas em sua cintura ele soube que havia chegado a hora e deixou-se levar. A câmara ecoava com os sussurros dos amantes, o baque dos corpos se chocando contra o chão de areia e aquele ruído ainda não identificado, que se intensificava a cada investida do incansável rapaz. Ela rolou o corpo de lado e o jovem entendeu o convite, virando-a totalmente de bruços. O comprido véu da moça cobriu seus quadris e ele, totalmente tomado de desejo arrancou-o. Então entendeu. Várias serpentes sibilavam no que deveria ser o cabelo da jovem. Aterrorizado, tentou fugir e na posição em que se encontrava acabou caindo sentado no chão. Ela virou-se lentamente para ele e continuou com o olhar baixo, comprimindo os lábios, o rosto agora quase choroso. E o que deveria ser racional para ele, não foi. Penalizado, estendeu a mão novamente para o rosto dela, que trêmula, o tocou, segurando sua mão para estender aquele toque de carinho. Suspirou fundo, sofrida, e ele não resistiu. Abraçou-a, apesar do chacoalhar das serpentes em seu rosto. Ela aninhou-se em seu colo e os dois ficaram assim, sem nada dizer ou fazer por muito tempo. Por fim, ele tocou-lhe os lábios com os dedos e inclinou-se para beijá-la. O beijo suave tornou-se novamente urgente e ela levantou um pouco o corpo, usando as pernas para se sentar por cima dele. Seu esforço foi reconhecido e os dois recomeçaram a se amar. Ela estava plenamente feliz e sorria enquanto se movimentava. As mãos dele tocaram-lhe o rosto e os lábios se comprimiram em sua bochecha, beijando-a ternamente. Seguiram o caminho até a sua boca, deixando os corpos executarem aquela dança tão ardente e quando ambos não aguentaram mais conter o desejo, deixaram que explodisse. Ainda ligados, continuaram o beijo e ele entreabriu os olhos quase sonolentos para admirar aquele rosto irreal. E aconteceu o que não devia. Sentindo-se amada, satisfeita, a jovem abriu os olhos no mesmo instante, mas arrependeu-se naquele momento.
Quando fossem descobertos, seria a estátua de pedra mais inusitada (e por que não a mais bela?) que já se teve notícia.
Recebido em 18 de maio de 2015
Imagem ilustrativa retirada do site: http://50anosrubi.blogspot.com.br/2014/01/medusa-deusa-da-mitologia-grega.html