Fantasticontos, escritos e literários

Blog para contos de ficção científica, literatura fantástica e terror

Dragão dos ventos


Málagon, o cinzento, voava pelos céus vermelhos e quentes à procura do que comer, ele sempre foi um grande caçador. Estava magro. Neste plano de existência, a vida é uma luta contínua, não há tréguas, não há descanso. Sua espécie ter sido expulsa para o mundo vermelho foi o pior castigo imaginado para eles. Séculos, milênios se passaram e nenhum deles sabe mais o motivo.

Mas espere. Algo se arrasta pela paisagem desértica abaixo, do alto parece um basilisco. Sabe que deve tomar cuidado, principalmente naquele ponto onde o mar de sal beija os lábios do deserto de fogo. Ali é o lar de criaturas poderosas deste mundo para as quais um dragão como ele seria uma boa presa. Ele circunda do alto por duas, três vezes, sua possível presa e desce lentamente.

Estranha a calmaria das águas em geral bravias do lugar, mas seu estômago precisa se alimentar e resolve arriscar. Sua presa se movimenta lentamente, será fácil desta vez. De relance observa um leve movimento no mar de sal e um olho que se entreabre, instintivamente ele sabe o que é. Bate as asas o mais rápido que pode, para cima, tentando sobreviver enquanto o Kraken levanta seu gigantesco tentáculo escondido na areia e mais outro que está dentro do mar atrás dele, numa tentativa frenética de alcançá-lo.

Málagon tem consciência que escapou por um triz da armadilha e resolve voltar para o interior da região montanhosa, onde é mais fácil se defender e melhor para se esconder. O estômago dói, e nesse momento ele já não sabe se é de fome ou medo.

Os céus estão sempre cheios de nuvens, mas uma particular chama a sua atenção. É mais escura que o normal e em seu interior uma luz amarela pisca intermitente. Ele se aproxima, lentamente, sem se importar com a chuva ácida que cai sobre sua pele grossa e escamas, até penetrar no lugar estranho…

****

Sirlene estava exultante. Depois de quase um ano e meio trabalhando na empresa, finalmente ela foi convidada para uma das festas. Seria uma comemoração do décimo aniversário da empresa Bis Marketing que ocupava os três últimos dos vinte andares do edifício Império III, no centro da cidade. Os diretores da organização haviam chamado a empresa coirmã, que pertencia ao mesmo grupo e ocupava os dois andares logo abaixo no prédio, para participar da festa. Seria uma confraternização muito especial devido a conclusão de uma série de contratos que geraram excelentes divisas.

Não era uma festa exclusiva para a diretoria, mas também não era aberta a todos os empregados, afinal o grupo, apesar de pequeno, contava com mais de mil funcionários. Sirlene havia ficado surpresa de ter sido convidada, ainda que de última hora, pelo diretor da empresa e topou de imediato, mesmo que fosse para agradar Roberto Menezes, o Beto, namorado dela. De qualquer modo estava satisfeita, afinal seria um grupo seleto entre trinta e quarenta pessoas, a “tchurma”, como dizia sua amiga Celina que era uma entusiasta daquelas festinhas, sempre convidada. Normalmente nos dias posteriores aconteciam as promoções de fim de ano ou bons aumentos de salários e isso para ela seria uma maravilha.

A festa estava indo bem, todos felizes se divertindo bastante, apesar de ter começado somente no final do expediente, foi muquiranagem da diretoria. Comida e bebida à vontade e até a churrasqueira foi liberada daquela vez. As moças haviam vindo mais elegantes, com roupas mais apertadas delineando o corpo, os rapazes com seus melhores ternos e as mais bonitas gravatas que foram simplesmente arrancadas depois do segundo chope.

Por volta das dez horas da noite o tempo começou a mudar. Primeiro foi uma brisa quente que aos poucos se transformou em ventos fortes e revoltos que emprestavam uma sensação de calor à noite.

Apesar do ambiente legal com direito a música e algumas bebidas mais fortes, algumas pessoas decidiram ir embora quando uma enorme nuvem escura começou a se formar em cima da cidade, com relâmpagos e trovões trazidos por aquele vento quente, que lembrava os ventos dos desertos.

Sirlene achou que a nuvem era estranha porque emanava uma estranha claridade de seu interior. Chamou Celina para ver a nuvem que apesar de bonita naquela noite de lua clara a incomodava. Estava chegando bem perto do prédio e ela ficou preocupada, e foi falar com seu namorado, Beto, que estava na hora de ir embora.

Beto viu que a proximidade da tempestade estava incomodando a moça e lhe disse que ali eles estariam seguros, se começasse a chover eles iriam para o andar de baixo.

Diante dos argumentos do namorado ela resolveu ficar. Beto e alguns dos seus colegas estavam secando um dos barris de chope que estavam à disposição na festa, e ela como toda mulher, começou a reclamar com ele que estava bebendo muito. Beto, sem a menor cerimônia, deu-lhe um beijo e entregou as chaves do carro em sua mão.

As meninas tinham se reunido para conversar sobre a festa e sobre os rapazes disponíveis que ainda estavam por ali, “dando mole”. Celina disse que tinham dois partidões, olhou para Sirlene e falou que ela nem pensasse, pois estava mais do que bem acompanhada.

Sirlene estava contente e a pedido das garotas começou a tirar algumas fotos da festa com o seu celular. Primeiro das meninas reunidas, outra dos rapazes tomando chope, já alegrinhos, uma do diretor Rocha e algumas outras. Paula pediu que encaminhasse as fotos para o e-mail dela, Sirlene achou que era uma boa ideia, aproveitou e encaminhou para ela mesma também.

Estava entretida com o envio das fotos e só depois que conseguiu voltou sua atenção para as colegas, quando algo muito estranho começou a acontecer. Reparou que uma de suas colegas, Paula, estava apontando para alguma coisa que passava entre os edifícios, voando à noite e todos riram muito da moça achando que ela estava de “pilequinho”.

Sirlene de início também riu. Talvez por uma pequena implicância com a garota que sempre achou superficial, talvez por no fundo ter que admitir que ela era muito bonita, alta, esguia e ter consciência que todos os homens tinham uma queda por ela.

Sirlene estava incomodada com alguma coisa, seu sexto sentido lhe dizia que realmente tinha algo errado. Ela estava perto e viu que Paula tentou falar com o diretor da empresa, explicar que ela realmente tinha visto uma criatura estranha voando entre os edifícios do centro da cidade, mas ele a abraçou e falou alguma coisa no ouvido da moça e deu uma leve apalpada no traseiro dela.

Paula se virou e saiu caminhando com a cara amarrada, passou por Sirlene que a chamou e perguntou o que ela tinha visto.

Ela disse que tinha visto um bicho do tamanho de um ônibus com asas voando entre os edifícios e que ia embora dali.

Sirlene nem teve tempo de fazer uma nova pergunta. De súbito um grito chamou a atenção de todos. Era um dos diretores, o Sr. Caldas, que estava meio deitado em uma das mesas e apontava para o alto.

Todos ficaram congelados com a cena. Uma criatura enorme se materializava diante deles, como um fantasma, meio translúcido. Aos poucos ia se tornando mais nítido, mais real. Parecia transitar entre dois mundos, duas realidades. O ser acinzentado com uma boca enorme, com escamas grandes e negras que cobriam a maior parte de seu corpo, tinha as asas abertas, dois chifres grandes um pouco recurvados para os lados e uma cauda enorme e pontiaguda com um tipo de unha ou osso que ela ficava chicoteando para os lados. Era simplesmente impressionante.

O que mais chamou a atenção de Sirlene foram os grandes olhos amarelos que pareciam chamá-la, como se tentasse hipnotizar as pessoas que o olhavam, algumas encantadas, outras estarrecidas. Abria a boca mostrando os dentes afiados e a língua pontiaguda e bifurcada como das cobras. A criatura apanhou o diretor Caldas com um das patas dianteiras e o abocanhou, partindo-o em dois pedaços e engolindo.

Naquela altura todos começaram a gritar alucinadamente e cada um corria em uma direção diferente. Sirlene viu mais um dos colegas de trabalho ser devorado vivo enquanto corria estabanadamente e sem direção se chocando contra mesas, cadeiras e desabando ao chão.

Quando ela conseguiu chegar perto da escadaria que dava acesso ao andar de baixo, viu que vinham mais algumas pessoas atrás. Correu para dentro quase que sem respirar. Ela percebia pelo tipo do grito quando eram apanhados pela criatura.

O grupo conseguiu se esconder nas escadas que levavam ao andar de baixo e ela reparou que as lâmpadas acendiam e apagavam intermitentemente. O que era aquilo, perguntavam alguns, que tipo de monstro era aquele, questionavam outros. Celina estava sentada no chão trêmula em seu vestidinho laranja curtinho que gostava de usar, segurando as mãos de Paula que parecia em choque.

Dragão, disse Celina com voz exasperada, aquilo era um dragão. Sim, ao menos era o que parecia, viu muitos balançarem a cabeça positivamente. Mas como seria possível se esse tipo de criatura somente existia em lendas e filmes de fantasia?

Sirlene começou a descer os degraus quando Beto, olhando em seus olhos, disse que ali estariam seguros e desceram lentamente a escadaria. Saíram no penúltimo andar onde a maior parte dos que estavam na festa trabalhava. Alguns já mais calmos, estavam ligando de seus celulares para a polícia e corpo de bombeiros para pedir ajuda, mas estranhamente os aparelhos não funcionavam, simplesmente não existia sinal. Beto pegou o telefone de sua mesa e foi a mesma coisa, não havia sinal na linha.

Beto estava estranho, tremia e não conseguia segurar com firmeza as coisas nas mãos. Ficou olhando para Sirlene e Celina que estavam encostadas uma na outra de mãos dadas. Perguntou então para Celina como ela sabia que aquilo era um dragão, se não podia ser outra coisa, um alienígena ou outra coisa qualquer.

Celina ficou quieta por alguns segundos e olhou para algumas pessoas que estavam perto e tinham escutado a pergunta do Beto, e começou a falar, mais para ela mesma, que sempre foi curiosa em relação a essas criaturas. Não que acreditasse fielmente, mas que já tinha lido bastante sobre elas, inclusive que já tinham sido realizadas pesquisas sérias sobre a existência delas em alguma época no nosso mundo. Disse que essas criaturas eram afeitas à magia, muitas extremamente poderosas e que muitas delas haviam conseguido escapar daqui para outras dimensões e que cada criatura era diferente uma da outra.

Naquele momento todos estavam em silêncio escutando suas palavras. Ela continuou.

Essas criaturas, dizia ela, segundo as lendas da Europa existem desde o princípio do mundo, desde os dinossauros. Aparecem nas escrituras judaicas e também em escritos gregos. No início eu também não dei muita atenção até que um dia simplesmente me lembrei da história de São Jorge e do dragão, da luta entre o herói e o mito. Essas criaturas têm o poder de dominar a mente das pessoas e muitas vezes fazer com que se esqueçam de tê-las visto. Eu continuei estudando essas lendas e descobri que elas existiam também em países como a Índia, o Japão e principalmente na China que, até hoje, reverenciam essas criaturas.”

O grupo estava em silêncio quando Beto perguntou como era possível se defender de uma criatura como aquela, se nas lendas contavam como fazer. Celina então falou que nas lendas europeias geralmente os cavaleiros matavam os dragões com espadas, como foi o caso de São Jorge.

De súbito eles ouviram um barulho no andar de cima, de móveis se arrastando e um urro grotesco. Imediatamente todos se agacharam ou sentaram no chão.

Sirlene viu de relance quando a criatura atravessou as janelas de vidro e paredes do edifício. Não quebrou, apenas atravessou como se fosse um fantasma ou se estivesse em um momento específico onde as realidades se confundem, e atacou de novo.

As leis da física do nosso mundo pareciam não valer para o dragão que materializava apenas a parte do corpo que lhe interessava para poder caçar.

Celina estava em pé quando ouviu o grito de Sirlene. Dessa vez não tentou correr, não teve vontade. Seu corpo parecia ter uma leveza fora do normal, virou-se e diante dela viu a criatura. Pensou nas perguntas que acabara de responder aos amigos, alguns de longa data e ficou apreciando a criatura enquanto ela urrava, esticando uma das patas e a levantado do chão em direção a bocarra. Estava dominada pelo monstro, nem mesmo gritou.

Sirlene já havia se levantado e como todos os que estavam ali na sala de recepção de visitantes da empresa começou a correr, arrastada pelo namorado. Escutou um grito e olhou para trás a tempo de reconhecer na boca da criatura o vestido laranja de sua amiga Celina que foi devorada viva pela criatura.

O pânico tomou conta de todos e começaram a correr desordenadamente em direção a um elevador que tinha as portas abertas e para a escada de incêndio.

Sirlene foi para a segunda opção depois que Beto a puxou pelo braço e a empurrou escada abaixo. Eles eram os últimos de uma pequena fila de pessoas que tentavam sobreviver passando correndo entre ambientes iluminados e a escuridão total.

Beto estava suando muito naquele instante em que descia correndo a escada. Um grupo de cinco ou seis pessoas haviam saído da escadaria no andar de cima e ele ficou tentado a fazer o mesmo, mas Sirlene corria escada abaixo em uma desabalada impressionante. Pensava nela a todo o momento. Achou engraçado porque normalmente não era assim. Tudo bem que ele gostava da menina, mas ali sua primeira preocupação era com ela. Ela tinha que sobreviver, ele não sabia bem o porquê, mas tinha. Amor pensou. Só pode ser o amor.

A última vez que Sirlene viu o namorado foi apenas de relance. Sentiu suas mãos tentando se segurar em algo, seus cabelos, quando o monstro apareceu do nada atrás deles e o abocanhou, desaparecendo na escuridão. A única coisa que passava em sua mente era correr, continuar correndo para salvar a própria vida.

Ela já tinha visto que alguns colegas seus haviam saído em algum andar acima, chegou a uma porta vermelha de ferro e a abriu, respirava com dificuldade e todo o seu corpo tremia de pavor. Estava suada e suja, mas principalmente apavorada. Entrou por um grupo de salas e se escondeu em um armário de mesa e lá ficou por muito tempo.

O esconderijo era pequeno e fedia a mofo, apertado e ainda por cima tinha papéis espalhados e ela tinha se espremido para caber sentada e com as pernas um pouco encolhidas.

Começou a pensar em sair depois de muito tempo, parecia que tinha se passado uma eternidade, mas ainda estava apavorada. Será que os outros tinham conseguido fugir? Será que tinha ainda alguém vivo? Tinha que sair dali.

Munida de toda a coragem Sirlene abriu uma parte da porta do armário e ficou esperando alguns segundos, escutando. Silêncio. Ela se esgueirou pela saleta e foi engatinhando em direção a porta de emergência, a tremedeira tinha voltado. Abriu a porta da saída de emergência e desceu as escadas até o subsolo onde ficavam os dois andares da garagem. Lembrava-se que Beto tinha lhe dado as chaves do carro para que ela dirigisse, pois ele já tinha tomado uma meia dúzia de chopes. A lembrança do namorado a entristeceu e ela começou a chorar, mas o medo fez com que permanecesse alerta.

Era sua oportunidade. Conseguiu encontrar o carro do namorado, abriu, entrou e ligou. Acendeu as luzes e foi na direção da saída. O sensor de presença da porta da garagem foi acionado e elas ruidosamente se abriram. Saiu acelerando, mas se apavorou quando achou ter visto uma sombra passando mais alto, pelo teto do carro. Não conseguiu identificar, e em seu desespero tinha certeza que era a criatura. Virou a direita na próxima avenida e olhou no retrovisor, algo escuro passou muito rápido pelo espelho, era ele.

Ainda olhava no retrovisor quando acelerou o carro e uma luz forte incidiu direto em seus olhos, pisou o mais fundo que pode no pedal do freio e não viu mais nada.

****

Málagon, o cinzento, estava satisfeito, tinha comido o suficiente e estava decidido a ir embora. Avistou a passagem iluminada no interior da nuvem escura e se dirigiu para lá. Apesar de ele nunca antes ter vindo para este mundo, já tinha ouvido seus irmãos comentarem que, às vezes, surgia um fenômeno natural que interligava as realidades e que alguns deles haviam cruzado essa passagem e que também muitos nunca mais voltaram, foram mortos ali.

****

Sirlene acordou na manhã de domingo com a mãe ao seu lado, estava em um quarto de hospital na cidade. Dona Sara estava muito preocupada com a filha que passou praticamente dois dias desacordada e, segundo os médicos, ainda inspirava cuidados. A polícia esteve no quarto depois que ela acordou e queria saber o que tinha acontecido, o porquê ela tinha batido o carro e principalmente de quem era o carro.

Normalmente uma batida de carros não tinha a importância devida para que a polícia enviasse um investigador, mas tinham também os desaparecimentos. As famílias de nove pessoas haviam acionado a polícia nas últimas quarenta e oito horas para denunciar os desaparecimentos, e o delegado titular havia determinado uma investigação, pois sete delas trabalhavam na mesma empresa, no mesmo prédio, ficando obvio que tinha alguma coisa muito errada.

Sirlene contou a história toda ao investigador Silveira na presença do médico que a estava atendendo. Ele foi muito educado ao não rir dela abertamente. O médico disse que provavelmente tudo o que ela acreditava ser verdade não havia passado de um sonho que teve enquanto estava desacordada.

O investigador Silveira avisou a ela que iria até a empresa no dia seguinte, para conversar com as pessoas e saber dos desaparecimentos e de quem era o carro, já que a mãe dela disse que a moça não tinha namorado há algum tempo.

Sirlene saiu do hospital na manhã seguinte e foi para casa, ainda estava muito confusa e também zangada com sua mãe, onde já se viu dizer que Beto nunca existiu. Logo ela que gostava do rapaz e que uma vez tinha dito que até que enfim ela arrumara um namorado que prestava.

Tinha que tirar tudo a limpo. Telefonou para o investigador Silveira e ele insinuou que gostaria de encontrá-la no dia seguinte, no final daquela tarde na Bis Marketing para que ela pudesse participar de uma acareação dos empregados, visto que alguns disseram nas conversas com os policiais que algumas daquelas pessoas não existiam ou não trabalhavam lá.

Sirlene encontrou com o inspetor Silveira na entrada do edifício, olhou para o céu e estremeceu. Estava escurecendo rápido e mesmo sendo final do outono o vento estava quente, fazendo com que as pessoas na rua tivessem uma sensação de desconforto, apesar da previsão do tempo avisar que poderia chover aquela noite.

Ainda no hall dos elevadores, Silveira confidenciou a ela que achava muito estranho a maior parte dos empregados não lembrar dos colegas e pior ainda de um dos diretores. Ela parou antes de entrar no elevador e lembrou-se que Celina havia dito que essas criaturas conseguiam hipnotizar os seres humanos e por muitas vezes faziam com que não conseguissem se lembrar desses encontros, e contou esse fato ao investigador, apesar de ficar com medo que ele a considerasse maluca. Silveira ficou em silêncio enquanto o elevador subia até o décimo oitavo andar. Quando saíram disse a ela que naquela investigação já não duvidava de mais nada.

Ela ficou surpresa ao encontrar os amigos, todos os que alcançaram o elevador haviam sobrevivido, assim como os que tinham saído antes da tragédia no final da noite. O diretor, a pedido do investigador, disponibilizou a sala de conferências para a acareação.

Silveira se apresentou e informou que a reunião seria rápida e para tirar algumas dúvidas e pontos obscuros das entrevistas. Primeiro perguntou sobre a festa. Para sua surpresa alguns disseram que nunca tinha acontecido. A confusão começou quando alguns que tinham saído antes da ameaça de chuva confirmaram que a festa existiu, o que acabou se transformando em discussão. Silveira então falou no segundo ponto que queria esclarecer que era a criatura que Sirlene tinha visto, o dragão que havia devorado sete deles.

Primeiro houve um silêncio constrangedor e depois todos riram bastante. Dragão, diziam uns. Quem o bichinho devorou, perguntou repentinamente o diretor Rocha, quase chorando de rir. O ambiente que até então estava tenso se descontraiu com as brincadeiras que aconteciam. Todos riam e alguns até fizeram comentários jocosos. Alguns começaram a pegar suas malas e bolsas e outros a se encaminhar para a saída da porta da sala de conferências quando uma voz mais alta calou a todos, como se fosse um banho de água fria.

O sr. Caldas, seu vice-diretor, ele está na empresa desde a criação, o senhor mesmo sempre diz isto em nossas reuniões. Também meu namorado, o Beto, um dos publicitários da equipe, disse Sirlene, olhando friamente para Rocha.

Todos ficaram em silêncio. Começaram alguns murmúrios. Estranhamente somente aqueles que não foram à festa ou saíram mais cedo se lembravam do Beto, embora a maioria se lembrasse do Sr. Caldas. Alguns disseram que o homem havia falecido a alguns anos, outros disseram que não, que ele havia se aposentado, menos Rocha que era amigo íntimo dele. Ele olhava as pessoas da sala de reunião com cara de assustado, levantou ambas as mãos pedindo silêncio, olhou para Silveira e disse que não sabia por que o Caldas não tinha ido naquele dia. O silêncio foi geral.

Sirlene perguntou de novo se mais alguém além dela que tinha ido à festa se lembrava do seu namorado. Ela estava desolada, ninguém. Paula estava sentada no sofá, no canto da sala de conferências, se levantou e perguntou para ela se o Beto não era um moreno alto que tinha trabalhado com Caldas há uns dois anos atrás e que tinha saído para ir trabalhar em outra empresa.

Sirlene balançou a cabeça negativamente e falou que ele nunca saiu da empresa desde que veio trabalhar. Foi o principal assessor do sr. Caldas, como eles podem não se lembrar dele. Ela estava realmente chateada com a situação.

Esperem um pouco, disse ela, tem uma pessoa que todos vocês gostavam, ela fazia todos sorrirem todos os dias. Vocês devem se lembrar da Celina, que trabalhava na gerência de marketing, ela que me trouxe para trabalhar na Bis.

Dela a maioria se lembrou, principalmente Rocha que tinha tido um relacionamento com ela tempos atrás. Ele não estava mais rindo, ninguém estava. Sirlene pegou um dos computadores e ligou o projetor multimídia, entrou em seu e-mail e começou a procurar a mensagem que havia enviado para Paula e para ela mesma. Achou as fotos e começou a exibir na tela de projeção. As imagens não eram de uma qualidade muito boa, pois era noite e a iluminação fraca. A primeira foto era das moças. Ali estavam Paula, Celina e as outras moças. A segunda foto era dos rapazes tomando chope.

Nessa hora ela se levantou e mostrou Beto e alguns começaram a se lembrar. A terceira foto era de um casal que nenhum deles lembrava, exceto Rocha que falou serem o diretor da empresa do grupo e sua esposa. Ambos haviam sido dados também como desaparecidos.

Sirlene se lembrava de tê-los visto pouco antes de entrar na escadaria. A quarta foto trazia o Sr. Rocha com um copo de whisky na mão, encostado na proteção de vidro de segurança. O que chamou mais atenção foi que atrás dele havia uma imagem desfocada, parecendo uma figura ao fundo, como se fosse um animal voando entre prédios vizinhos.

Todos olhavam a foto quando trovões e relâmpagos iluminaram as janelas da sala de conferência, os ventos fortes fazendo estremecer os vidros. Sirlene começou a tremer e se agarrou no investigador Silveira quando as luzes do edifício Império III começaram a apagar e acender, apagar e acender, apagar e acender… Málagon, o dragão cinzento dos ventos, voltou.

Fim

Conto escrito por Swylmar Ferreira*                              imagem meramente ilustrativa

  • Este conto foi escrito para desafio realizado pelo site a irmandade.

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Publicado às 3 de março de 2018 por em Contos, Contos Fantásticos e marcado .

A saga de um andarilho pelas estrelas

DIVULGAÇÃO A pedido do autor Dan Balan. Sinopse do livro. Utopia pós-moderna, “A saga de um andarilho pelas estrelas” conta a história de um homem que abandona a Terra e viaja pelas estrelas, onde conhece civilizações extraordinárias. Mas o universo guarda infinitas surpresas e alguns planetas podem ser muito perigosos. O enredo é repleto de momentos cômicos e desconcertantes que acabam por inspirar reflexões sobre a vida e a existência. O livro é escrito em prosa em dez capítulos. Oito sonetos também acompanham a narrativa. (Editora Multifoco) Disponível no site da Livraria Cultura, Livraria da Travessa, Editora Multifoco. Andarilho da estrela cintilante Por onde vai sozinho em pensamento, Fugindo dessa terra de tormento, Sem paradeiro certo, triste errante? E procurar o que no firmamento, Que aqui não encontrou sonho distante Nenhum outro arrojado viajante? Volta! Nada se perde com o tempo... “Felicidade quis, sim, encontrar Nesse vasto universo, de numerosas, Infinitas estrelas, não hei de errar! Mas ilusão desfez-se em nebulosas, Tão longe descobri tarde demais: Meu amor deste lugar partiu jamais!”

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Bom dia.
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Madhu terá que tomar uma difícil decisão. E aprenderá a usar seu poder sombrio em benefício da Luz.

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