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O arrastão


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O calor estava insuportável naquele fim de tarde e o engarrafamento monstro simplesmente não ajudava em nada. Além disso, o maldito carro não tinha ar refrigerado.

– Pobre é uma merda.

Carlos olhou para o relógio do carro, eram 16h00min no horário de verão.

– Tá me cozinhando os miolos. Minha cabeça vai explodir – deve ser o cheiro de removedor que estão usando na reforma lá no trabalho, pensou.

A irritação com o calor aumentou quando um dos carros que estava à frente abriu o som, com um funk. Outro carro, para complicar ainda mais, colocou outra música a todo o volume, parecia sertanejo.

– Detesto esses tipos de musica.

De onde estava, Carlos não conseguia distinguir uma da outra. Na terceira música, ele já estava em desespero. Sabia que se fechasse os vidros do Golzinho, morreria de calor. Tudo estava dando errado em sua vida, a mulher o largou, foi obrigado a trocar de função no emprego e acabou aceitando um salário mais baixo. Sabia que tinha sido sacaneado. Suas mãos tremiam.

Pegou a garrafinha de água no banco do lado e viu que mal tinha um gole.

– Onde estão os vendedores?

Os moradores da comunidade onde ele reside e que fica ao lado da rodovia, sempre se arriscam vendendo água, refrigerantes e às vezes cerveja para os motoristas presos no engarrafamento diário. Naquele momento não via ninguém com isopor na cabeça ou na separação de pistas da rodovia. Precisava de paciência, a saída que usava para ir para casa ou para empresa era a menos de duzentos metros.

Música alta, calor, pessoas em pé ao lado dos carros, sirenes ao longe, passar mais um dia inteiro sem comer, transformava aquela hora do dia em um horror. Horror maior sentiu quando percebeu um arrastão, pessoas correndo para todos os lados e finalmente tiros.

Desesperou, largou o Golzinho ali mesmo e correu, mas lembrou-se da pasta com o computador do trabalho.

– Merda!

Voltou ao carro e viu a pasta no banco de trás. Ia saindo quando levou um soco no rosto que quase o derrubou. O ladrão puxou a pasta das mãos dele, que instintivamente a segurou.

Sabia que devia soltar a pasta e o fez, mas tarde demais.

Ouviu um estrondo alto, como um canhão. A cabeça zumbiu e as imagens defronte a seus olhos embaralharam, olhou o bandido e viu uma pistola na direção de sua cabeça, inclinou-se para trás e segurou a arma. O criminoso continuou a agredi-lo, mas Carlos era grande e forte, jogou-o contra o Golzinho e na luta outro tiro foi disparado. Apavorou-se quando viu a tampa da cabeça do cara saltar.

Carlos sentiu forte dor ao tentar falar, pedir socorro. Foi quando percebeu que o primeiro tiro o havia atingido no rosto. Olhou a camisa e viu uma enorme mancha vermelha.

Mais tiros, quatro ou cinco homens atiravam contra ele, mas estava armado agora e todo o ódio contido por meses, anos, desabrochou. Abaixou-se e sentiu o vidro do carro se estilhaçar e cair em sua cabeça. Todos gritavam naquele momento. Olhou o veículo ao lado e uma mulher apontava o dedo indicador para sua frente. Alguém vinha por ali. O segundo bandido surgiu apontando um revolver na direção da mulher, quando Carlos atirou de novo.

O homem pareceu surpreso ao vê-lo, como se perguntasse: de onde você apareceu?

A dor estava passando, assim como o calor. Olhou à frente, dois homens tentavam arrastar a ocupante de outro carro. Carlos andou os metros que os separavam e atirou na cabeça do primeiro homem, em seguida no peito do segundo. Ele tinha o mesmo olhar surpreso.

Outro grupo de pessoas atravessava a rua jogando pedras e paus em sua direção. Ele abaixou e pegou o revolver do segundo bandido e atirou contra eles. O primeiro tiro atingiu uma mulher que caiu como um saco de batatas. O segundo, um garoto com um facão nas mãos, que o chamava “pra porrada”. Ele atirou mais três vezes, ao menos um acertou.

Olhou para cima e helicópteros voavam em círculos pelo lugar, pareciam moscas em cima de carniça.

A mulher do carro ao lado, a mesma que lhe apontara o bandido, gritou que a polícia estava chegando e que havia pedido uma ambulância para ele. Estava descontrolado e sabia que tinha que sair dali.

Os carros milagrosamente começaram a andar abrindo um corredor. Ele entrou no Golzinho e conseguiu sair da avenida.

– Vou pro trabalho e de lá pro hospital – disse se olhando no retrovisor – o desgraçado quase me arrancou a mandíbula.

Carlos viu que um dos helicópteros o seguia. Parou no estacionamento da empresa e entrou com a arma em punho, causando pânico nos que ali estavam.

Imediatamente a polícia cercou o prédio e seus colegas, que pareciam não o reconhecer, se acotovelavam procurando correr em direção à saída. Ele atirou para o alto e os que não conseguiram sair correram para um canto do prédio onde ficava a sala da chefia.

Já não conseguia pensar em mais nada. Uma televisão ligada anunciava que um assassino louco havia atirado em inocentes na avenida e feito reféns numa empresa perto dali. A repórter informou que a polícia cercou o lugar e tentava negociar com o “suspeito”.

Mesmo com dor insuportável, ouviu as lamúrias de colegas pedindo que os libertassem, que se entregasse, eles jamais o ameaçariam. Procurou relembrar cada momento importante de sua vida, seus pais falecidos, a irmã assassinada pelo namorado traficante, as sacanagens no trabalho.

Olhou para a rede de energia e viu o cabo que alimentava o prédio passando sobre sua cabeça. Subiu em uma cadeira e acendeu o isqueiro na rede de sprinkler.

Ouviu um vidro quebrar e sentiu uma dor terrível no braço esquerdo. Uma bala atravessou o braço e outra penetrou seu abdome. Bombas de fumaça foram jogadas no interior do prédio. Carlos sentou-se na cadeira observando o piso do prédio inundado e disse aos colegas para saírem.

Puxou o cabo de energia na junção e ficou com ele na mão. Quando os primeiros policiais se aproximaram, Carlos soltou o cabo de energia.

– Que se fod…

 

 

 

Fim

Um conto de Swylmar Ferreira

imagem meramente ilustrativa retirada do site: robertoalmeidacsc.blogspot.com

Um comentário em “O arrastão

  1. Ronaldo Brito
    21 de maio de 2021

    Ótimo conto.

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Publicado às 28 de fevereiro de 2015 por em Contos e marcado , .

A saga de um andarilho pelas estrelas

DIVULGAÇÃO A pedido do autor Dan Balan. Sinopse do livro. Utopia pós-moderna, “A saga de um andarilho pelas estrelas” conta a história de um homem que abandona a Terra e viaja pelas estrelas, onde conhece civilizações extraordinárias. Mas o universo guarda infinitas surpresas e alguns planetas podem ser muito perigosos. O enredo é repleto de momentos cômicos e desconcertantes que acabam por inspirar reflexões sobre a vida e a existência. O livro é escrito em prosa em dez capítulos. Oito sonetos também acompanham a narrativa. (Editora Multifoco) Disponível no site da Livraria Cultura, Livraria da Travessa, Editora Multifoco. Andarilho da estrela cintilante Por onde vai sozinho em pensamento, Fugindo dessa terra de tormento, Sem paradeiro certo, triste errante? E procurar o que no firmamento, Que aqui não encontrou sonho distante Nenhum outro arrojado viajante? Volta! Nada se perde com o tempo... “Felicidade quis, sim, encontrar Nesse vasto universo, de numerosas, Infinitas estrelas, não hei de errar! Mas ilusão desfez-se em nebulosas, Tão longe descobri tarde demais: Meu amor deste lugar partiu jamais!”

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Bom dia.
Aproveito este espaço para divulgar o livro da escritora Melissa Tobias: A Realidade de Madhu.

- Sinopse -

Neste surpreendente romance de ficção científica, Madhu é abduzida por uma nave intergaláctica. A bordo da colossal nave alienígena fará amizade com uma bizarra híbrida, conhecerá um androide que vai abalar seu coração e aprenderá lições que mudará sua vida para sempre.
Madhu é uma Semente Estelar e terá que semear a Terra para gerar uma Nova Realidade que substituirá a ilusória realidade criada por Lúcifer. Porém, a missão não será fácil, já que Marduk, a personificação de Lúcifer na Via Láctea, com a ajuda de seus fiéis sentinelas reptilianos, farão de tudo para não deixar a Nova Realidade florescer.
Madhu terá que tomar uma difícil decisão. E aprenderá a usar seu poder sombrio em benefício da Luz.

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Oi pessoal, o site EntreContos - Literatura Fantástica - promove novos desafios, com tema variados sendo uma excelente oportunidade de leitura. Boa sorte e boa leitura.

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